terça-feira, 31 de outubro de 2017

{Outubro Trevoso} [Resenha] Abominação

“Porque a guerra é uma amante ciumenta. Tem um jeito de nos chamar de volta para ela, muito depois de pensarmos que nos despedimos para sempre.” (Página 73)



“Abominação” começa sem eufemismos. Aqui tudo é muito óbvio e gráfico. Na minha ingenuidade, até cheguei a pensar que este seria um livro arrastado, bem parado, ahhh doce ignorância… Sua narrativa te abocanha nos primeiros parágrafos e é impossível não querer saber qual será o próximo monstro a sair dos confins da mente de Gary Whitta.

Esse livro ganhou com louvor o título de livro mais sangrento de 2017 e não é como se eu só lesse livros meigos, vamos levar isso em consideração


A história se passa no período das invasões vikings. Com receio de uma nova invasão dos nórdicos, o rei da Inglaterra, Alfredo, autoriza seu arcebispo da Cantuária, Aetherel, a continuar seus estudos de nove pergaminhos pagãos que escondem um poder capaz de salvar milhares de vidas - ou no caso, ceifar.

Após dar carta branca para o arcebispo, Alfredo passa a questionar sua decisão. O rei perde o sono ao perceber seu erro, já que esse poder “divino” só pode ser obra de um deus mais funesto. Restam apenas seus mais fiéis cavaleiros para combater esse poder maldito e restaurar a luz no reino.

“Algo morno e úmido envolveu seu braço. Ele soltou a tocha em choque - e de súbito foi puxado para a frente, desaparecendo na escuridão da cela. E, em seguida, veio o grito, enquanto seu estrebuchar desesperado se projetava em sombras nas paredes da cela com a luz da tocha caída.” (Página 34)


Procurei esquivar dos spoilers e não ler nem a sinopse de “Abominação”. A única coisa que eu sabia sobre essa história é que envolvia vikings (sério?) e sangue. Muito sangue. Justamente por não ter expectativas quanto essa leitura é que eu me surpreendi tanto. Ainda não tinha lido nada de Whitta e tive uma surpresa muito bem vinda.

A narrativa de Whitta é viciante e muito dinâmica. A maneira com que ele amarra cada capítulo só aumentava a sede por mais. Este é um daqueles livros que não vai te deixar em paz até você terminá-lo - me atrevo a dizer que nem mesmo após o seu fim você terá sossego.

Com uma narrativa que se divide em duas partes, “Abominação” apresenta uma primeira parte cheia de ação e tripas voando para todos os lados, enquanto na segunda parte, 15 anos depois dos acontecimentos da primeira parte, seu ritmo cai quase à beira de um coma, só para ressurgir novamente e arrebatar nossos corações.


A sensação que eu tive enquanto caminhava para o fim foi que as coisas estavam ficando cada vez mais complexas, e eu não via uma saída desses problemas surgindo até o final do livro... Meus medos se concretizaram ao termos uma resolução simples e previsível, que tornou uma história eletrizante e espetacular em um clichê da fantasia.

Porém, o clichê passa desapercebido quando levamos em consideração toda a magnitude do enredo. E para quem já está acostumado a ler fantasia - quem não está não vai achar esse clichê um clichê - sabe bem que dos males, este foi o menor.

Um outro aspecto que deixou a desejar foi o desenvolvimento dos personagens. Whitta passa a sensação de que eles têm um elo muito forte de amizade e lealdade, porém isso não é mostrado. Os personagens acabam parecendo rasos e suas motivações parecem sem fundamento devido a esse vácuo deixado inexplorado.


“Odiava sua raiva, mas ao menos a entendia. A raiva era simples e pura, um elemento básico, como o fogo. Sabia exatamente de onde vinha e como planejava se livrar dela. Não havia mistério.” (Página 159)

Gary Whitta é um roteirista que ficou conhecido pelo seu trabalho com “O Livro de Eli”, “Depois da Terra” e mais recentemente, “Rogue One”. Ao ler “Abominação” fica clara a capacidade de Whitta em escrever histórias que podem ser perfeitamente adaptadas ao cinema, só podemos aguardar por um futuro sangrento.

Em “Abominação” fazemos parte de uma viagem histórica pelos corredores mais sujos e escuros. Podemos espiar pelas fechaduras mais antigas e descobrir os segredos mais terríveis. Este é um livro com um enredo grotesco, sangrento, com um final um tanto previsível, porém que é tão bem construído que torna esta jornada de lágrimas, sangue e tripas como um passeio no parque - da desgraça.


Autor: Gary Whitta
Editora: Darksidebooks
Número de páginas: 320
Classificação: ★★★★★♥/✰✰✰✰✰


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