"Para um prato mais exótico e aromatizado, recomenda-se substituir 2,5 kg de entrecôte de cordeiro por 3,2 kg de glúteo máximo humano." (Página 129)
Em “Jantar
Secreto” aprendemos que, em matéria de carnes, é melhor sempre duvidar da
procedência...
A vida não podia ser melhor para Dante
e seus três amigos de infância, Miguel, Leitão e Hugo. Eles se mudam de Pingo
d’água, uma cidadezinha esquecida por Deus no interior do Paraná, para um
apartamento dos sonhos em Copacabana, no Rio de Janeiro.
Como nenhuma alegria dura para sempre –
até porque se essa história fosse feliz, não teria sido escrita pelo Raphael
Montes – eles começam a ter problemas financeiros. Qual é o melhor modo de
arranjar dinheiro rápido que não envolva roubo e sequestro? Se você pensou em
ganhar na loteria errou (você deveria sentir vergonha de si mesmo, seu sem
imaginação...). Os quatro amigos resolvem organizar um jantar secreto – e pomposo
– no seu apartamento. Mas que diabos é um jantar secreto? É um jantar realizado em segredo – não é ciência nuclear, na
verdade é bem simples.
"Naquele fim de tarde, sinto que me tornei um monstro." (Página 230)
"Naquele fim de tarde, sinto que me tornei um monstro." (Página 230)
Alguns pequeeeeeeeenos problemas aparecem no meio do caminho e agora eles estão
com os dois pés enterrados na bosta devem organizar um jantar utilizando
como matéria prima carne humana. Quer
dizer, carne de gaivota (não me
venham com mimimis sobre spoilers, a
própria sinopse revela muito mais que deveria – aliás, não leiam a sinopse,
leiam logo o livro).
"Deixa de ser besta... A mulher já tava morta. Depois de morto, todo bicho é igual. Você é engraçado, sabia? Se a carne vem naquele pacote, coberto no plástico transparente, você não se importa. Pega, frita e come sem nem pensar de onde veio. Agora fica aí, cheio de mi-mi-mi. Quer saber? A única diferença é que não sou hipócrita como você." (Página 97)
Amigos
que organizam jantares secretos onde o prato principal é a carne de gaivota. Achou o enredo estranho? Você ainda não viu nada... Como
já é de praxe, Raphael Montes é capaz de cativar o leitor na primeira página.
Com uma narrativa envolvente e extremamente dinâmica que evolui drasticamente a
cada capítulo, e um desfecho que promete destruir seu cérebro, “Jantar Secreto” entrou para a lista de
melhores leituras de 2017.
“Jantar
Secreto” é o mais novo romance do autor
nacional Raphael Montes. Se você já leu alguma de suas obras sabe que ele
capricha no grotesco, no difícil de
engolir, e que ele é muito bom no
que faz. Se você ainda não foi calejado no asqueroso, prepare-se para uma
imersão como nunca antes vista.
Um problema simples escala de uma forma
tão absurda, e envolve tantas pessoas que é praticamente impossível não querer
arrancar os cabelos em desespero. Cada uma das situações do livro faz com que
questionemos a nossa própria sanidade se estivéssemos com a corda no pescoço e
prestes a cair no poço infinito da desgraça.
"A ideia de fundo do poço é um tanto consoladora. Quando você acha que chegou lá, só pode subir. Acontece que o fundo não existe, sempre pode ser pior." (Página 244)
Acho que o principal ponto deste livro
é que seres humanos são terríveis. Somos capazes de fechar os olhos para
atrocidades por não querermos sair da nossa zona de conforto, enquanto pequenas
coisas causam uma comoção colossal e sem o menor sentido. Como eu já disse
algumas vezes (e mais recentemente na resenha de “Mestre das Chamas”) a natureza humana é podre. Somos atraídos pela desgraça e
pelo caos como uma mariposa é atraída por uma chama de uma vela. No nosso âmago
sabemos que vamos nos queimar, porém é simplesmente irresistível nos
aproximarmos do fogo.
Ainda não li o primeiro romance do
autor “Clube dos Suicidas” (está na
lista das próximas leituras), mas levando em conta “Dias Perfeitos”, seu segundo romance, é notável a evolução e o
amadurecimento da sua escrita. Se ele já começou escrevendo romances tão
perturbadores, e considerando o tamanho da bola de neve que foi “Jantar Secreto”, eu só posso imaginar
– e sonhar – quanto ele ainda pode crescer.
Precisamos parar de falar mal de
autores nacionais (ainda existem pessoas assim?). Ainda mais com a gama de
gêneros com nomes de peso. Se você não gosta de romances românticos e acha que
não existem autores de terror nacionais magníficos, eu sugiro que você faça o
seu dever de casa e comece a ler os monstros da literatura nacional
contemporânea.
"A vida é assim: você precisa ter a cara esfregada no esgoto e sentir o cheiro da morte para começar a tentar se redimir." (Página 259)
Este livro mostra – na verdade esfrega
na nossa cara – até que ponto a ganância e o desespero de uma pessoa podem
chegar. Qual será o limite da maldade de um monstro? Será que ele existe?
Autor: Raphael Montes
Editora: Companhia das Letras
Número de páginas: 360
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Classificação: ★★★★★♥/✰✰✰✰✰
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